PRINCÍPIOS DA MEDITAÇÃO
Bokar Rinpoche
(...)
Como
meditar
Estabelecidos em um local
isolado, é-nos necessário libertar nosso corpo de toda atividade, libertar
nossa mente dos pensamentos concernentes ao passado e ao futuro, libertar nossa
palavra de toda conversação profana. Nosso corpo, nossa palavra e nossa mente
são deixados em repouso, naturalmente à vontade.
A postura corporal é importante.
Nosso corpo é percorrido por uma rede de canais sutis (nadis) nos quais
circulam os ventos sutis (prana). A produção dos pensamentos está ligada
à circulação desses ventos. A agitação do corpo engendra a agitação dos canais
e dos ventos, que, por sua vez, favorece as turbulências mentais.
A atividade oral, a formação
dos sons, também depende da atividade dos ventos. Falar em demasia perturba-os,
aumentando a produção de pensamento. Guardar o silêncio favorece a meditação.
Preservar a calma da palavra
e o corpo predispõe, portanto, à calma interior evitando a criação de um fluxo
de pensamentos demasiado abundante. Tal como um cavaleiro, controlando bem sua
montaria, está sentado comodamente, quando o corpo e a palavra estão
controlados, a mente está predisposta ao repouso.
Falsas idéias são às vezes
alimentadas quanto ao que é a meditação. Para alguns, meditar é passar em
revista e analisar os acontecimentos de sua vida cotidiana ocorridos nos dias,
meses e anos passados. Para outros, meditar é encarar o porvir, refletir sobre
a conduta a manter, formar projetos a mais ou menos longo prazo. Essas duas
abordagens são evidentemente errôneas. A produção de pensamentos concernentes
ao passado ou ao futuro está por si mesma em contradição com estabelecimento da
mente na calma, mesmo quando o corpo e a palavra permanecessem inativos. Na
medida em que o exercício não conduz à paz interior, não é meditação.
Outras pessoas, acreditando
meditar, não vão em busca nem do passado nem do futuro. Instalam-se, isto sim,
num estado vago e impreciso, vizinho do tipo de torpor que uma grande fadiga
engendra. A mente permanece numa indeterminação obscura, estado que pode
parecer positivo na medida em que proporciona, antes de tudo, uma impressão de
repouso benfazejo; todavia, falta-lhe total lucidez e não tarda a resvalar para
o sono, a menos que não desemboque numa corrente de pensamentos descontrolados.
A verdadeira meditação evita
esses escolhos: a mente despreocupada com o passado, sem encarar o futuro,
enraizado num presente lúcido, claro e calmo. A noite só permite uma percepção
muito obscura do mar, enquanto o dia deixa ver com precisão todos os detalhes:
as cores, as ondas, a espuma, os rochedos, o fundo submarino. Nossa mente é
semelhante ao mar. O meditador deve estar plenamente consciente da situação
interior, percebida de modo tão claro quanto o mar à luz do dia. Ele deixa,
então, sua mente tranqüila e as ondas acalmam-se naturalmente. É a calma
interior, tecnicamente denominada pacificação mental (em tibetano shine).
Inúmeros métodos são
utilizados para desenvolver shine. Um principiante pode, por exemplo,
visualizar uma pequena esfera de luz branca ao nível da fronte e nela
concentrar-se no melhor de suas capacidades. Podemos também nos concentrar no
vaivém da respiração, ou ainda, sem tomar um objeto de concentração particular,
deixar a mente sem distração. Podemos utilizar esses três métodos e, por aí,
aprender progressivamente a meditar.
Por sinal, é importante
abordar uma sessão de meditação com a mente muito ampla, muito aberta, sem
estar fixada sobre a esperança que ela seja boa nem o temor que não o seja. A
mente deve estar tranqüila, disponível e vasta. Esperar uma boa meditação ou
temer uma ruim são, em si mesmo, entraves dos quais precisamos estar libertos.
A meditação dá-nos, às vezes,
experiências de felicidade e paz. Satisfeitos conosco regozijamo-nos por termos
feito uma boa meditação. Às vezes, ao contrário, nossa mente permanece muito
perturbada, durante toda a sessão, por numerosos pensamentos e, tristemente,
julgamo-nos péssimos meditadores. Regozijar-se por uma boa meditação e ligar-se
a experiências agradáveis, assim como entristecer-se por um meditação ruim são
duas atitudes falsas. Meditação boa ou ruim, o importante é simplesmente
meditar.
Algumas pessoas, quando de
seus começos, obtêm rapidamente boas experiências; estas ligam-se a estas,
esperam sua repetição constante e, quando não é o caso, decepcionadas,
abandonam a meditação. No transcurso de uma longa viagem, percorremos ora bons
caminhos, ora ruins. Se os encantos de uma porção agradável servissem de
incentivo para nos determos para deles usufruir continuamente, ou então, se as
dificuldades do caminho ruim nos fizessem renunciar a avançar, nunca
alcançaríamos nosso objetivo. Caminho bom ou ruim, é mister avançar. Da mesma
forma, no caminho da meditação é necessário perseverar sem preocupar-se com as
dificuldades nem ligar-se aos momentos felizes.
É preferível, para os principiantes, limitar-se a
curtas sessões de dez ou quinze minutos. Mesmo que a meditação seja boa,
devemos parar. Depois, se dispusermos de tempo necessário, faremos uma segunda
sessão curta após uma pausa. Melhor é proceder por uma sucessão de curtas
sessões do que engajar-se numa longa sessão que, mesmo boa no início, corre o
risco de resvalar para a dificuldade e cansar o meditador.
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