Este
texto tem por objetivo, de modo simples e didático, expor o
significado do termo jurisdição, bem
como sua implicação prática na contemporaneidade. Entendida tradicionalmente como o poder-dever de aplicar o direito
aos casos levados ao Poder Judiciário (nos processos judiciais), jurisdição
nada mais é, por um lado, do que a obrigação que o Estado tem de solucionar os
conflitos interpessoais que não o foram de maneira espontânea. Dito de outra
forma e exemplificando: caso não se chegue a um acordo relativo aos prejuízos
causados por um jarro que acidentalmente um morador de um apartamento derrubou
em cima de um veículo estacionado no térreo de um prédio de apartamentos,
poderá o proprietário do carro distribuir (manejar ou “dar entrada”) em
eventual ação de reparação de danos.
Esse
é o sentido do “dever” jurisdicional. Quanto ao “poder” ele o é de fato e de
direito, ou seja, aos ocupantes do cargo na carreira da magistratura nacional é
conferida a autoridade estatal de decidir o pleito das partes envolvidas em
determinada situação, a qual não foi amigavelmente resolvida. Tal posição de
mando é prevista já a partir do texto constitucional[1]
e em vários dispositivos na legislação infraconstitucional[2].
Ou seja, é o(a) juiz(a) que tem, nos limites previstos no ordenamento normativo
brasileiro, não apenas a prerrogativa mas a obrigação de resolver a demanda
proposta. Tal tarefa pode até parecer “simples” para algumas pessoas, mas
definitivamente não é bem assim. Isto porque o chamado poder jurisdicional, muito mais do que simples e mecanicamente “ler”
a lei e aplicá-la a uma situação fática, precisa, igualmente, atender a várias
outras expectativas. Grosso modo, a
sociedade contemporânea, em seu afã pela satisfação das necessidades
individuais e coletivas, exige uma resposta direta, concreta e eficiente nos
processos judiciais.
O que se quis dizer na última oração é
que ao(a) julgador(a) não basta apenas cumprir um “mero” papel de tecnocrata do
Direito, ou seja, não é suficiente que apenas “diga” ou conceda o direito
pleiteado pela parte, mas deve fazê-lo também:
i) apresentando argumentos que sejam ao mesmo tempo convincentes e sensatos e;
ii) determinando atos processuais eficazes,
ou seja, que tragam resultados efetivamente úteis à pessoa interessada.
Novamente: esta tarefa não é, de modo algum, fácil. Se por um lado o Poder
Judiciário conta com uma estrutura composta por servidores, aparato
tecnológico, instalações modernas, entre outros, por outro enfrenta dois
grandes inibidores de sua atividade: o enorme número de demandas propostas,
além da ainda legislação processual que (infelizmente?) permite recursos de
caráter nitidamente protelatório.
A tentativa de superar a situação
descrita pode ser observada, por exemplo, em estratégias elaboradas e implementadas
pelos Órgãos Jurisdicionais, como as “Metas Nacionais do Poder Judiciário”,
desenvolvidas em encontros e colocadas na prática pelos respectivos Tribunais
pelo país afora[3].
Tudo isto foi dito para que se possa, ao final, valer-se do processo judicial
para fazer uma justiça consistente, sólida, utilizando propostas significativas
como a que faz PERELMAN (1999, p.163): “Na concepção atual do direito, menos
formalista, porque preocupada com a maneira pela qual o direito é aceito pelo
meio regido por ele e que, por isso mesmo, se interessa pelo modo como uma
legislação funciona na sociedade, é impossível identificar pura e simplesmente
o direito positivo com o conjunto de leis e regulamentos, votados e promulgados
em conformidade com critérios que lhes garantem a validade formal. Pois pode
haver divergências consideráveis entre a letra dos textos, sua interpretação e
sua aplicação”.[4]
[1] Art. 93, Inciso I:
“ingresso na carreira, cujo cargo inicial será o de juiz substituto, mediante
concurso público de provas e títulos, com a participação da Ordem dos Advogados
do Brasil em todas as fases, exigindo-se do bacharel em direito, no mínimo,
três anos de atividade jurídica e obedecendo-se, nas nomeações, à ordem de
classificação”
[2] Apenas como exemplo,
o atual art. 1º do CPC: “a jurisdição civil, contenciosa e voluntária, é
exercida pelos juízes, em todo o território nacional, conforme as disposições
que este Código estabelece”. Interessante observar que no Anteprojeto do Novo
Código de Processo Civil a jurisdição ganha contornos diferenciados, pela
leitura do art. 1º (“o processo civil será ordenado, disciplinado e
interpretado con-forme os valores e os princípios fundamentais estabelecidos na
Constituição da República Federativa do Brasil, observando-se as disposições
deste Código”) e 4º (“as partes têm direito de
obter em prazo razoável a solução integral da lide, incluída a atividade
satisfativa”).
[3] Exemplo disso pode
ser observado na exposição feita pelo Conselho Nacional da Justiça, no seguinte
link: http://www.cnj.jus.br/gestao-e-planejamento/eventos/encontros-nacionais/4-encontro-nacional-do-poder-judiciario/metas-2011.
[4] PERELMAN, Chaïm. Lógica jurídica. São Paulo: Martins
Fontes, 1998, p. 163 e segs.
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