terça-feira, 28 de agosto de 2012

Mandado de segurança e competência para julgamento




Importante questão, para todas os(as) profissionais do Direito que militam nos Tribunais do país, diz respeito à competência para o julgamento do Mandado de Segurança[1] ou, em outras palavras, a definição da autoridade coatora da qual emana o ato que se quer anular. A pertinência temática do texto fica ainda mais evidente se for observado que é relativamente comum vários writs (outra denominação do Mandado de Segurança) serem indeferidos liminarmente sob o argumento, nas decisões, de que foram distribuídos no foro incorreto ou, dito de outra forma, que se trata de incompetência absoluta em razão de hierarquia ou, se o caso, matéria.

A discussão se inicia pela leitura e conjugação do art. 5º, inciso LXIX da Constituição Federal, com o art. 1º da Lei 12.016/09[2], visto que tais dispositivos não são explícitos ou exaustivos ao conceituar o que vem a ser autoridade, limitando-se apenas dizer, no primeiro caso, que se trata de “autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público” e, no segundo, de “autoridade, seja de que categoria for e sejam quais forem as funções que exerça”. Alguém poderia argumentar que o termo autoridade, ao menos nessa situação, não exigiria demarcação ontológica, mas a praxis forense diz exatamente o contrário e tem sido o Poder Judiciário, em inúmeras situações, que empreendeu o árduo trabalho de (às vezes quase indecifrável) exegese da norma.

E é justamente nos casos concretos que se verifica a grande dificuldade em se fixar o sentido do termo indicado, confirmando que não se trata de um trabalho meramente teórico a ser feito. Exemplifico, desta forma, com um caso concreto. O Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios, em determinado Mandado de Segurança (MS)[3], ao analisar o pedido feito pelo autor, ementou em acórdão[4] que “o mero executor do ato administrativo, determinado pelo Tribunal de Contas da União, é parte ilegítima para figurar no polo passivo do Mandado de Segurança”, mas deve ser mencionado que tal ação foi proposta justamente com a finalidade de se anular ato prescrito pelo próprio Presidente daquela Corte.

Ao autor da ação não havia qualquer dificuldade em perceber que se a autoridade mencionada (o Presidente do TJDFT) ordenou a produção de certo ato administrativo, seria ela a autoridade coatora, mesmo considerando a anterior (e já revogada) lei de regência do MS[5]. A indigitada ação foi extinta sem resolução do mérito e incontinenti foi manejado recurso ordinário[6] a fim de que o Superior Tribunal de Justiça se pronunciasse, não sobre o mérito do direito discutido, mas acerca da competência para o julgamento da causa, visto que o Tribunal a quo, entre outros argumentos, explicitou que naquele caso específico a autoridade indicada como coatora era mera longa manus de uma decisão do Tribunal de Contas da União.

Em elaborado raciocínio, a Corte Superior explicitou, em sede recursal[7] que “segundo a Lei n. 12.016/2009, a autoridade passível de legitimidade passiva do pedido de segurança não é somente aquela delegatária imediata que dá execução ao ato, mas também a que detém poderes e meios para executar o futuro mandamento, porventura, ordenado pelo Poder Judiciário (autoridade delegante)”, determinando, então, que o processo retornasse ao TJDFT para que este, agora sim, julgue o pedido inicial. O relator do recurso, inclusive, deixou muito claro o posicionamento do STJ ao dizer igualmente que “a autoridade que deve figurar como coatora na impetração é aquela que, concretamente, praticou a ação ou omissão lesiva ao direito do impetrante”, bem como aquela que “detém poderes para corrigir a ilegalidade”.


[1] Regido pela Lei n° 12.016, a qual entrou em vigor em 07/08/2009 e pôs fim a algumas controvérsias que serão consideradas ao longo do texto.
[2] Cujos conteúdos, respectivamente, são: “conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas-corpus ou habeas-data, quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público” e “conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, sempre que, ilegalmente ou com abuso de poder, qualquer pessoa física ou jurídica sofrer violação ou houver justo receio de sofrê-la por parte de autoridade, seja de que categoria for e sejam quais forem as funções que exerça.” (grifei)
[3] MS 2008.00.2.002789-5, de relatoria do Desembargador Getulio Pinheiro.
[4] Acórdão registrado sob o n° 346571, com data de julgamento em 25/11/2008.
[5] Lei n° 1.533/51.
[6] Com fundamento no art. 102, inciso II, alínea a da Constituição Federal e art. 539, Inciso I, do Código de Processo Civil.
[7] RMS 29713/DF, de relatoria do Ministro Jorge Mussi.

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