Importante
questão, para todas os(as) profissionais do Direito que militam nos Tribunais
do país, diz respeito à competência para o julgamento do Mandado de Segurança[1]
ou, em outras palavras, a definição da autoridade
coatora da qual emana o ato que se quer anular. A pertinência temática do
texto fica ainda mais evidente se for observado que é relativamente comum vários
writs (outra denominação do Mandado
de Segurança) serem indeferidos liminarmente sob o argumento, nas decisões, de
que foram distribuídos no foro incorreto ou, dito de outra forma, que se trata
de incompetência absoluta em razão de hierarquia ou, se o caso, matéria.
A
discussão se inicia pela leitura e conjugação do art. 5º, inciso LXIX da
Constituição Federal, com o art. 1º da Lei 12.016/09[2],
visto que tais dispositivos não são explícitos ou exaustivos ao conceituar o
que vem a ser autoridade,
limitando-se apenas dizer, no primeiro caso, que se trata de “autoridade
pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público”
e, no segundo, de “autoridade,
seja de que categoria for e sejam quais forem as funções que exerça”. Alguém
poderia argumentar que o termo autoridade,
ao menos nessa situação, não exigiria demarcação ontológica, mas a praxis forense diz exatamente o contrário
e tem sido o Poder Judiciário, em inúmeras situações, que empreendeu o árduo
trabalho de (às vezes quase indecifrável) exegese da norma.
E é
justamente nos casos concretos que se verifica a grande dificuldade em se fixar
o sentido do termo indicado, confirmando que não se trata de um trabalho
meramente teórico a ser feito. Exemplifico, desta forma, com um caso concreto. O
Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios, em determinado Mandado
de Segurança (MS)[3],
ao analisar o pedido feito pelo autor, ementou em acórdão[4]
que “o mero executor do ato administrativo, determinado pelo Tribunal de Contas
da União, é parte ilegítima para figurar no polo passivo do Mandado de
Segurança”, mas deve ser mencionado que tal ação foi proposta justamente com a
finalidade de se anular ato prescrito
pelo próprio Presidente daquela Corte.
Ao autor
da ação não havia qualquer dificuldade em perceber que se a autoridade
mencionada (o Presidente do TJDFT) ordenou a produção de certo ato
administrativo, seria ela a autoridade coatora, mesmo considerando a anterior
(e já revogada) lei de regência do MS[5].
A indigitada ação foi extinta sem resolução do mérito e incontinenti foi manejado recurso ordinário[6]
a fim de que o Superior Tribunal de Justiça se pronunciasse, não sobre o mérito
do direito discutido, mas acerca da competência para o julgamento da causa,
visto que o Tribunal a quo, entre
outros argumentos, explicitou que naquele caso específico a autoridade indicada
como coatora era mera longa manus de
uma decisão do Tribunal de Contas da União.
Em elaborado raciocínio, a Corte Superior
explicitou, em sede recursal[7]
que “segundo a Lei n. 12.016/2009, a autoridade passível de legitimidade passiva
do pedido de segurança não é somente aquela delegatária imediata que dá execução
ao ato, mas também a que detém poderes e meios para executar o futuro
mandamento, porventura, ordenado pelo Poder Judiciário (autoridade delegante)”,
determinando, então, que o processo retornasse ao TJDFT para que este, agora
sim, julgue o pedido inicial. O relator do recurso, inclusive, deixou muito
claro o posicionamento do STJ ao dizer igualmente que “a autoridade que deve figurar
como coatora na impetração é aquela que, concretamente, praticou a ação ou
omissão lesiva ao direito do impetrante”, bem como aquela que “detém poderes
para corrigir a ilegalidade”.
[1] Regido pela Lei n°
12.016, a qual entrou em vigor em 07/08/2009 e pôs fim a algumas controvérsias
que serão consideradas ao longo do texto.
[2] Cujos conteúdos, respectivamente,
são: “conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo,
não amparado por habeas-corpus ou habeas-data, quando o responsável pela
ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa
jurídica no exercício de atribuições do Poder Público” e “conceder-se-á mandado de segurança
para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, sempre
que, ilegalmente ou com abuso de poder, qualquer pessoa física ou jurídica
sofrer violação ou houver justo receio de sofrê-la por parte de autoridade, seja de que categoria for e sejam quais
forem as funções que exerça.” (grifei)
[3] MS
2008.00.2.002789-5, de relatoria do Desembargador Getulio Pinheiro.
[4] Acórdão registrado
sob o n° 346571, com data de julgamento em 25/11/2008.
[6] Com fundamento no
art. 102, inciso II, alínea a da
Constituição Federal e art. 539, Inciso I, do Código de Processo Civil.
[7] RMS 29713/DF, de
relatoria do Ministro Jorge Mussi.
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