sexta-feira, 19 de agosto de 2011

O Karma e suas implicações - III



Vou fazer algumas considerações acerca do primeiro dos preceitos da panca-sila, a saber, não matar e não ferir qualquer ser. É preciso lembrar, em primeiro lugar, que se trata(m) de preceito(s) que tem um propósito específico, ou seja, não se trata apenas de uma regra estabelecida apenas para que se torne letra vazia de sentido: conduzir à libertação do samsara.

Desta forma, ao dizer que não se deve matar ou ferir outros seres, poder-se-iam traçar várias exegeses acerca da mesma. Mas, segundo entendo, o bom senso deve prevalecer. Se levássemos tal preceito às últimas conseqüências, sequer poderíamos comer um alface, visto que, ao cortar o pé de alface, estaríamos matando um outro ser vivo. A seguir este raciocínio, teríamos que "viver de luz"...Talvez isso se aplique a seres de outros planos, como nos reinos paradisíacos, mas, em nível ordinário como o nosso e para todos os seres de nosso plano de existência, ainda não é praticável.

Assim, entendo que uma das primeiras coisas que devemos ter em mente para este preceito é a nossa intenção. Parece-me evidente que, por exemplo, ao estar dirigindo numa estrada, em velocidade regular, e se um cachorro, uma pessoa, entre outros, deliberadamente se atira na frente do seu carro, é atropelada e morre, é sensato compreender que não tivemos sequer o desejo quanto mais a culpa no sentido de ocasionar o desencarne de tal criatura. Por outro lado, por uma série de ligações cármicas, também entendo que pelo simples fato de ter acontecido, é evidente que trata-se de um resgate cármico. Agora, como cada pessoa lidaria com tal situação, também faria muita diferença.

Retomando o ponto inicial, temos sempre que pensar na intenção ao lidar conosco e com o Universo. Talvez a atitude "extrema" de se sacrificar para que outro(s) seres(s) não sejam mortos ou feridos fosse considerada por muitos como suicida ou doentia. Não entendo dessa forma. Nas Jatakas, inclusive, existem vários relatos do Buda se sacrificando para que outros seres, futuramente, venham a ser seus discípulos.

Ainda comentando a primeira das panca-silas, a saber, não matar e não ferir nenhum ser, podemos fazer ainda algumas inferências. Em primeiro lugar, parece-me razoável que numa situação extrema seria sensato tomar uma atitude que, aparentemente, contrariaria o preceito. Imagine-se uma situação na qual um pessoa, por intermédio de uma bomba, ou o que quer que seja, poderia causar a morte de, digamos, 3000 mil seres humanos e nossa única, exclusia, absolutamente definitiva alternativa, para evitar tal tragédia, seria matar tal pessoa. Qual atitude a tomar?

Penso que seria falta de bom-senso considerar que, pelo fato do preceito nos colocar como regra que não devemos matar ou ferir outros seres, deveríamos deixar acontecer a mortandade de 3000 outros seres. Com isto quero deixar absolutamente claro que não concordo, não aprovo e não coaduno com quaisquer formas de violência gratuita ou deliberada. Talvez, na situação acima, o ideal seria que chegássemos ao extremo de nos sacrificar pela vida de tais pessoas. Mas, como já comentei, em se tratando de seres ordinários, tal pedido parecesse descabido.

Uma digressão acerca da primeira panca-sila diz respeito, por exemplo, ao fato de comer ou não comer carne animal. É evidente que se se come carne (bovina, aves ou peixes), também se está participando de uma cadeia que se inicia pela matança daqueles seres e, no mínimo, concorda-se com isso. Interessante que passei praticamente 20 anos sem comer carne e, neste ano de 2011 retomei esse hábito alimentar. Mas, sinceramente, não entendo que esse seja o ponto principal para o caminho da iluminação.

Como já disse em outras passagens, o fundamental é nossa atitude (mental, discursiva, da prática), nossa intenção, nossa postura e conduta diante de nós mesmos e daquilo que nos rodeia.

Paz, Paz, Paz.
Luz, Luz, Luz.
Amor, Amor, Amor.

Tulio

Nenhum comentário:

Postar um comentário